LIDERANÇA: LAVAR OS PÉS OU AS MÃOS?

O gesto de Jesus no lava-pés é claro: a autoridade é uma função de serviço. O próprio Cristo fala: "Eu, que sou o Mestre e o Senhor, lavei os seus pés; por isso vocês devem lavar os pés uns dos outros. Eu lhes dei o exemplo: vocês devem fazer a mesma coisa que eu fiz." (Jo 13,14-15).

Com esse gesto, Jesus mudou o direcionamento do poder. Antes o poder era considerado privilégio. Com Cristo, passou a ser sinônimo de serviço, principalmente serviço aos que mais sofrem. As relações de poder, após o ensinamento do Mestre, devem ser norteadas pelo amor que se torna doação. “Ele, que tinha amado os seus que estavam no mundo, amou-os até o fim” (Jo 13,1b).

Por isso não há que se falar em privilégios porque a função de um possui mais autoridade que a do outro. A relação formada entre os cristãos é de fraternidade e doação. Lavar os pés é o mesmo que assumir um compromisso de serviço e amor ao próximo; é assumir o compromisso do Reino que leva à Cruz e à Ressurreição.

Muitas pessoas, cristãs ou não, fizeram da mesma forma que Cristo e passaram a vida lavando os pés dos outros. Gandhi, Luther King, Steve Biko, D. Oscar Romero, Chico Mendes, Margarida Maria, D. Hélder Câmara, Padre Josimo Tavares, Madre Teresa de Calcutá, Irmã Dulce, Irmã Dorothy Stang, Padre Gisley Azevedo Gomes, entre tantos outros, anônimos ou não, são exemplos de líderes que, na sua função de autoridade, nada fizeram além de servir e amar o próximo, mesmo colocando em risco as suas próprias vidas. Hoje ainda encontramos esses líderes nos diversos movimentos sociais, em comunidades, associações de moradores e igrejas, e eles não se cansam de viver a proposta de Jesus até o fim.

Porém Pilatos, governador da Judeia, lavou as mãos (Mt 27,24). Ele tinha a autoridade para soltar Jesus (Jo 19,9-12). Ele sabia da inocência do Cristo, mas para preservar seu cargo submeteu-se à farsa criada pelo Sinédrio e permitiu a morte de alguém que nada fez de errado (Jo 19, 12b-16). Ele não prendeu Cristo e não pediu sua crucificação, mas o fez porque aceitou as pressões de uma elite odiosa e cruel que desejava manter um povo submisso às suas vontades e caprichos, através de uma lei injusta que foi duramente criticada por Jesus. Pilatos tinha o poder para libertar Jesus, mas por medo de perder seus privilégios foi conivente com o crime formulado pelos poderosos.

E quantas lideranças são como Pilatos! Podem salvar os diversos Cristos presentes nos milhares que padecem de fome, de falta de moradia, políticas públicas, segurança e carinho, mas nada fazem. Simplesmente lavam as mãos, permitindo que os Cristos sejam torturados, crucificados e mortos por aqueles que usam o poder para sua própria vontade e egoísmo, mantendo, dessa forma, uma sociedade que aceita uma cultura de morte, totalmente contrária ao Reino pregado por Jesus.

São dois líderes, cada um representando dois projetos de sociedade totalmente antagônicos entre si. Pilatos representa uma ordem social pautada no capital, na exploração do trabalho dos pobres e no privilégio de uma elite que exclui e marginaliza quem não está dentro de seus padrões. Para Pilatos nada importa, desde que ele não perca seus privilégios. Por isso mesmo ele se omite e cede às ameaças dos poderosos.

Já Jesus é a liderança maior de um Reino em que não há privilégios, onde há vida plena para todos (Jo 10,10), independentemente da situação social. No Reino de Jesus Cristo, a maior lei é o amor (Jo 13,34-35), e a maior prova desse amor é doar a vida em favor dos irmãos (Jo 15,13).

Por isso, a todos nós ficam alguns questionamentos: De que tipo de líderes precisamos? Que tipo de líderes somos? Somos como Pilatos, que foi covarde e omisso ao ser conivente com a crucificação de Jesus? Ou somos como Cristo, capazes de amar até o fim?
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MARI MALHEIROS
Militante da Pastoral da Juventude, estudante do curso de "Fé e Política" na Diocese de Guarapuava/PR e advogada.

Fonte: Jornal Mundo Jovem
 
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